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Jéssica e Thiago – O moço sorriso e a menininha

Sempre é muito difícil apontar um casamento que o celebrante possa considerar marcante. Tenho vários e este certamente sempre é citado.

Eu me lembro com detalhes da primeira vez que os vi. Marcamos em uma cafeteria de um shopping center. Cheguei mais cedo, liguei o notebook, organizei o contrato que eles iriam assinar e aguardei. Eis que chegam a menininha e o rapaz tatuado. Ela mais solta e ele mais sério. Esses primeiros minutos diante de um casal são muito interessantes. Nunca se sabe exatamente o que está por vir. Os noivos sempre chegam com muitos sonhos, desejos e dúvidas. Esse é um dos últimos momentos em que eles ainda são completos estranhos para mim. Logo, iria mergulhar na história deles e, como sempre digo, seguir com a sensação de que ela se torna um pouco minha também.

Já estava em conversa com a Jéssica e o jeito meigo das mensagens pelo Whatsapp se confirmou naquele primeiro contato. Thiago, o rapaz que a princípio achei de expressão séria, daqui a pouco começou a mostrar sorrisos e hoje para mim é o “moço sorriso”. Mas, uma coisa me intrigava. Eles não esboçavam aquela euforia desenfreada de boa parte dos casais. Pelo contrário, ouviam as sugestões que eu dava e com muita tranquilidade aceitavam. Até que eles me pediram algo que me assustou: uma homenagem póstuma para a mãe dela e para o pai dele, ambos falecidos meses antes do casamento.

Francisca, a mãe da noiva, tinha o sonho de vê-la casada e falava muito sobre o casamento da filha quando partiu. Os planos então tiveram que mudar. Jéssica foi morar com o Thiago antes mesmo do casamento. Ele a apoiou no que pode. Meses depois, Wilson, o pai do noivo, faleceu. Foi a vez de Jéssica dar todo o suporte para o Thiago. Essa história me fez entender o comportamento diferente daquele casal sentado a minha frente. Eles já estavam casados, por força do destino, muito antes da cerimônia. Mas precisavam cumprir as etapas, com a maturidade que lhes foi imposta a força, de maneira dolorosa. E o fariam com toda a reverência àqueles que os levaram a ser quem são hoje.

No primeiro momento, agi com sinceridade aos noivos. Fui claro ao dizer que uma homenagem póstuma poderia interferir na vibração positiva que é inerente aos casamentos. Cogitei que as pessoas certamente iriam chorar bastante e que isso poderia ser um caminho sem volta. Eles ouviram, entenderam, mas me explicaram que era uma etapa indispensável na cerimônia. E assim foi a primeira conversa. Voltei para casa reflexivo e temeroso.

As semanas se passaram e achei por bem que os noivos não me ajudassem na missão de homenagear os pais falecidos. Pedi o contato de pessoas próximas para descobrir quem eram Francisca e Wilson. Uma prima da noiva e a irmã do noivo foram minhas fontes. Chorei ao receber as devolutivas delas, chorei ao escrever o texto, chorei ao revisar o texto, chorei ao ensaiar o texto e estou chorando agora. Mas, o mais importante, não chorei na cerimônia. Vejam, eu sou super a favor de deixar a emoção vir no momento em que ela bate. Tenho até um pouco de pena das noivas que não choram para não borrar a maquiagem. Acho triste interiorizar emoções! Mas é que no momento da cerimônia, aquela emoção não poderia ser minha. Era para eles. Só para eles. Mas depois eu conto como foi.

A cerimônia foi realizada em uma tarde de sábado, ao ar livre, na Fazenda Marambaia, em Limeira. A caminho de lá, recebi uma notícia meio chata de uma amiga e aquilo derrubou a minha vibração. Antes de descer do carro, dediquei alguns momentos a estabilizar o que eu sentia e a me esforçar para sair daquele vibe que não tinha nada a ver comigo e com a cerimônia que celebraria dentro de instantes. A caminho da área onde estava montada a cerimônia, vi a linda estrutura que receberia a festa. Uma tenda gigante abrigava as mesas decoradas com muito requinte. Alguns metros a frente, avisto o “moço sorriso”, que me recebeu com muita alegria. Conversamos rapidamente e fui logo para o altar para me ambientar. Naquele momento, reikiano que sou, decidi que faria aquela cerimônia no canal de reiki para minimizar os resquícios da sensação de “soco no estômago” que descrevi acima. Ainda escreverei um texto sobre o reiki. Basicamente, os reikianos canalizam a energia presente do universo e aplicam em alguma finalidade. Já havia recebido esse conselho de uma mentora que me é muito importante. Para isso, fiz alguns gestos singelos.

Era chegada a hora de a cerimônia começar. De repente, os convidados ouvem o barulho de uma moto chegando. Era o noivo, amante do motociclismo e, em especial, do motocross. A chegada de moto foi uma das possibilidades que sugeri a ele ainda na conversa no café do shopping center. Os convidados ficaram extasiados. Explicando melhor: ele chegou de moto até o início do corredor central e depois fez a entrada tradicional, a pé, junto com a mãe. Depois de surpreender os convidados, o que o noivo não sabia é que havia algo preparado para ele. Já com todos os padrinhos e madrinhas na região do altar, eis que surge a voz da noiva e uma linda declaração. A “menininha” ia entrar.

Jéssica adentrou o espaço da cerimônia radiante. Iluminada! Contagiou a todos com a energia positiva que emanava. Com ambos no altar, comecei a cerimônia. Contei um pouco da história dos dois, fiz algumas brincadeiras, recebemos a imagem de Nossa Senhora Aparecida, santa da qual são devotos, e era chegada a hora da homenagem aos pais. Essa foi a estrofe inicial:

“Nesta tarde, recordamos com muito carinho daqueles que não se encontram fisicamente nesta cerimônia, mas que se fazem presentes nos corações e na memória de todos. Lembramos, em especial, da mãe da Jéssica e do pai do Thiago, que deram um grande exemplo em vida.”

Eu me lembro que assim que li as primeiras palavras do trecho acima, o Thiago levou as mãos aos olhos e veio aquela emoção que só um filho que perdeu o pai consegue entender. E foi pelo pai dele que comecei. Segui contando a todos o que já sabiam: o quanto Wilson havia sido fundamental para aquela família. Minutos depois, era a vez de relembrar a batalhadora Francisca e o exemplo de mulher. Foi a vez de Jéssica se comover. A cada trecho sobre os pais, fiz questão de direcionar meu olhar aos olhos dos filhos diante de mim. Era o momento deles. Era somente para eles. Ao assistir a gravação dias depois, observei a emoção de padrinhos ao fundo, ouvi o choro contido da moça que filmava e me surpreendi com o eco que aquela homenagem teve nas pessoas. Como contei antes, eu tive receio quanto a essa decisão dos noivos, mas Jéssica e Thiago acertaram. Francisca e Wilson precisavam ser lembrados de forma escancarada. Eles mereciam aquele momento e, hoje, acredito que fizemos da melhor forma possível: com sutileza, verdade e muito amor.

Os noivos se recompuseram e a cerimônia seguiu com leitura de trecho da Bíblia, oração, assinatura da ata do efeito civil e caminhou até o final com uma energia fantástica. Ficou gravada na minha memória a saída dos noivos com os últimos raios de sol do dia passando por entre os galhos de uma árvore frondosa. Fiquei no altar contemplando aquela imagem. Quando boa parte dos convidados já havia dispersado, com muita gratidão, comecei a recolher meus pertences do altar. Eis que se aproxima uma moça e me diz: “Eu vi o que você fez!”. Eu devo ter feito uma cara de susto gigantesca e antes mesmo que eu dissesse algo, ela completou: “Sou reikiana”. Nós rimos juntos, conversamos rapidamente sobre essa paixão similar, o reiki, e nos despedimos. Foi aí que percebi que até já havia me esquecido daquela sensação da notícia ruim que havia recebido. Acredito que foi pelo reiki, mas acho que certamente fui contagiado por outras energias como a do Thiago, da Jéssica, de todos os que estavam ali vibrando por eles e também de Francisca e Wilson.

Foi um dia inesquecível! Tive diversos contatos com a “menininha” pelo Whatsapp depois e estive duas vezes, rapidamente, com o “moço sorriso” para encerrarmos os trâmites do cartório. Eu os levo no coração com muito carinho. Adoro ver as fotos deles nas redes sociais esbanjando felicidade. Eles merecem! É curioso como a gente percebe que com alguns noivos os vínculos irão se encerrar logo ao final cerimônia e os motivos sãos vários. Desde a distância entre as cidades até o perfil comportamental. Mas com Jéssica e Thiago sinto algo diferente. Tenho uma certeza estranha de que continuaremos sintonizados por um bom tempo. Fico muito feliz, grato por isso e muito honrado por terem me permitido fazer parte dessa história tão linda.

4 comentários em “Jéssica e Thiago – O moço sorriso e a menininha”

  1. Chorei ao ler o texto! Imagino a emoção na hora e imagino o quão lindas foram as suas palavras na cerimônia! Que dom, João! Parabéns!

  2. Oi João
    Sou irmã do noivo, o moço sorriso, e posso te dizer que vc foi essencial nesse casamento, soube fazê-lo com uma leveza sem igual, apesar de tudo que estávamos passando.
    Parabéns

    1. Oi Cristiane
      Agradeço demais o reconhecimento. Thiago e Jéssica mereciam um momento lindo, a altura do casal que formam.
      Linda a família de vocês. Sou muito grato por ter participado deste momento de vocês.

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