Se aproximava o casamento de um casal extremamente minucioso com os detalhes do casamento e estava tudo alinhado. Com bastante antecedência, eles haviam escolhido as etapas que gostariam de viver durante a cerimônia e eu estava bem tranquilo na semana que antecedia o grande dia. Eis que sou surpreendido com a mensagem de uma familiar no meu Whatsapp a poucos dias do casamento.
Muito gentil, essa parente explicou que tomou a liberdade de me chamar para comunicar que a noiva era muito devota de uma santa e que, por isso, gostaria de sugerir a inclusão de uma oração pelo casal. Seria uma surpresa para os noivos, pois, segundo essa familiar, coincidentemente, o casamento seria realizado no dia em que os católicos celebram a fé pela santa.
Confesso que em um primeiro momento não achei invasivo. Achei até carinhoso, pois, segundo ela, a noiva chegou a presenteá-la com imagens dessa santa no retorno de viagens. Tudo parecia fazer muito sentido. Contudo, uma vez que os noivos definem o que querem viver, eu não altero mais. Expliquei isso para essa familiar. Por via das dúvidas, ao chegar mais cedo no dia da cerimônia, resolvi compartilhar essa história com a cerimonialista, que também achou estranho. Eu já tinha uma apoiadora em meu posicionamento.
Decidi fazer uma última checagem sobre a viabilidade de acatar o pedido dessa parente. Várias perguntas passavam pela minha cabeça. “E se, de fato, fosse algo muito impactante para a noiva? E se, na correria do casamento, ela não tivesse percebido que aquele também era o dia da santa da qual era devota?”. Vários “e se?” me atormentavam há alguns dias. Resolvo conversar com o noivo.
Expliquei a abordagem que havia acontecido durante a semana, o tom afetuoso do pedido da parente, descrevi minha posição e quis saber a dele. Surpreso, e com contundência, ele me cravou: “A noiva não é devota dessa santa!”. Minha primeira reação foi até engraçada, pois, diante de tantas dúvidas, essa era a única certeza. Respondi: “O que? Como assim ela não é devota?”. Pela forma como a história me foi contada, essa era uma verdade absoluta para mim. Tanto que a minha primeira reação não foi sobre incluir a oração ou não. Foi o susto diante da afirmação de que ela não era devota. A conversa terminou com ele dizendo para não alterar o que já estava combinado, pois para ele também não faria sentido. Pronto! Estava decidido.
Logo a cerimônia começou e não tive tempo de dar a notícia para a autora do pedido que, aliás, sentou-se na primeira fileira de cadeiras. Ela certamente aguardava ansiosa pelo momento da oração, o que não aconteceu. Fui embora sem ter essa conversa com ela pessoalmente, mas consegui comunicar um outro familiar sobre a posição do noivo.
Já em casa, depois da cerimônia, recebo uma mensagem dela querendo saber se eu tinha dito ao noivo quem era a autora do pedido. A pergunta foi feita em um tom desconfiado, como se ao ouvir o nome dela ele certamente devesse ter acatado. Eu disse que o nome dela foi citado e expliquei a posição dele. Ela agradeceu e nunca mais nos falamos. Confesso que fiquei curioso sobre a repercussão dessa história durante a festa.
Esse fato veio confirmar minha posição. Uma vez que o casal decide o roteiro, ninguém altera. Nem familiar, nem cerimonialista e nem eu. Caso tivesse adicionado um novo momento na sequência da cerimônia, certamente teria cometido uma gafe imperdoável diante do casal. O ônus seria todo meu. Esse é um exemplo que também cabe a você. Se algum dia for convidado para um casamento, restrinja-se ao papel de observador. Prestigie e enaltece as decisões do casal.
João Paulo Baxega, é jornalista e celebrante de casamentos